domingo, 16 de setembro de 2012

Penélope...


Os fios dos dias meus eu mesma cardo e urdo,
E teço o meu viver com muitos pontos, laços,
Bordando sem cessar todos os seus espaços,
Ainda que p’ra alguns tecer seja um absurdo.
Eu não me importo não, se escuto eu não me aturdo,
eu sigo o meu viver, tecendo os próprios passos,
E se preciso for desmancho, sim, refaço,
Neste fazer sem fim de meu destino surdo.
E faço sem cessar a minha tessitura,
teço co’a luz do sol, no breu da noite escura,
Sem nunca descansar ou demonstrar cansaço.
Coloco em meu tecer mil sedas de ternura,
Buscando conseguir a mais bela textura,
Mas se preciso for, teço com fios de aço!

O mito de Penélope mostra uma das mais claras e populares imagens de feminilidade, da pessoa que espera pelo amor enquanto pacientemente borda, tece, junta os fios e as cores. A referência à difícil trama dos tapetes, do desencontro dos fios e da combinação das cores, tanto nos reporta aos acontecimentos da própria existência, tecidos por uma dolorosa memória, como nos fala de criação, invenção e a possibilidade de conhecer outros caminhos.
A tela que Penélope tece tem o objetivo de protegê-la e aquecê-la. Destituida de afeto, ela tece para cuidar de si mesma em seus piores momentos de solidão e, ainda que espere por Ulisses por toda sua vida, não tece porque espera, ela tece a sua solidão, seu sentimento de abandono, de orfandade e rejeição. Enquanto espera, desfaz os pontos antigos, cria outros desenhos, novas matizes à espera de si mesma. A espera é uma contagem regressiva da esperança que Penélope coloca nos laços e nós de sua tapeçaria.
A palavra "texto" vem de tecer. Quem escreve tece uma ideia, uma narrativa, na tentativa de encadear a memória, as lembranças e a própria história. Acho que, não por coincidência, sou historiadora, aquela que tece a história. Trabalho com a escrita, vivo a escrever. Mas que teço eu?! Assim como Penélope, teço uma longa espera... não sei do quê... de um grande amor talvez, de uma redenção, da salvação... o motivo já não importa. Sei que teço, que escrevo a minha eterna espera...  sempre escrevi, porque sempre esperei.... essa é a minha sina...

Fonte: http://poesiaretro.blogspot.com.br/2012_05_01_archive.html
Fonte: http://eventosmitologiagrega.blogspot.com.br/2011/07/penelope-o-amor-que-nao-se-cansa-de.html

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